terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Reencontro com velhos amigos

Como alguns já conhecem dos relatos do ano passado todas as bases têm as suas regras e quando se vive em comunidade convêm que estas sejam cumpridas. A base argentina Decepción não é, nesse tema, uma excepção.

Aqui toma-se o pequeno-almoço às 8h00, almoça-se às 13h00 e janta-se às 21h00. O nosso trabalho é essencialmente no campo e salvo que as condições meteorológicas não nos permitam vamos estar muitas vezes fora. Contudo, estes 3 horários são aqueles que tentaremos cumprir rigorosamente. São estes 3 momentos que juntam toda a dotação da base, que aproximam as pessoas e que fazem com que, mais tarde, a permanência aqui seja tão inesquecível.

Depois do pequeno-almoço foi altura de ir fazer uma visita à Base Espanhola Gabriel de Castilla para cumprimentar a todos, ver quem está do ano passado, conhecer os novos e tratar do assunto das comunicações. Para além de mim, do Mário, do Horácio e do Ernesto acompanha‑nos à Base Espanhola o nosso chefe de base. Mas quando estamos mesmo para sair chegam à nossa porta o chefe de base espanhol (Fernando) com mais um militar. Ao Fernando eu já o conhecia do ano passado, ele havia estado por aqui no final da campanha para conhecer a base, ver como funcionava e depois acabamos por viajar juntos, no Las Palmas, até Ushuaia onde nos voltámos a cruzar uma série de vezes. Eles andavam a fazer um reconhecimento de campo para estes lados e por isso continuaram enquanto nós fomos para a base deles.

Como sempre os reencontros entre as pessoas que partilharam a experiência antárctica são emocionantes, mas estes 3 que se seguiram foram-no especialmente. Ao chegarmos à base espanhola desceu logo o Juan (que estava a montar o novo módulo de vida) a cumprimentar‑nos. Este era o único militar que eu sabia que, da dotação anterior, estaria este ano novamente na base. Normalmente as dotações militares não repetem as estadias na Antárctida uma vez que é um local onde quase todos gostavam de vir. Contudo, existe sempre um elemento da dotação anterior que repete e este ano sabia que seria o Juan uma vez que é dos que melhor conhece o tema da construção dos novos módulos. Mas de repente apareceu o Jesus, um dos militares com quem tinha melhor relação no ano passado, com quem fiz a minha primeira “Maria” na base, com quem sai da ilha e que ainda por cima no final da campanha ainda nos vimos em Ushuaia. Assim que, quando nos vimos os abraços e os olhares que se trocaram foram inesquecíveis. Estes momentos de reencontro tanto com o Juan como com o Jesus dizem mais que mil palavras e são para sempre inolvidáveis. De seguida entramos para o módulo de vida, não há como explicar a sensação, pois é mais forte do que a que senti quando entrei na base argentina. Era de novo a sensação de regressar a casa, de ver como nada mudou, incluindo a bandeira do projecto LATITUDE60!, que o ano passado ofereci à base, que estava no mesmo sítio. As coisas continuam iguais e enquanto uns tomavam café eu fui tratando de preparar o meu chá. Foi neste momento que entrou o Amos, um dos investigadores que o ano passado ficou comigo até ao final, e aconteceu mais um reencontro. É inexplicável a afinidade e proximidade que temos a estas pessoas que no fundo partilharam connosco apenas 3 semanas das nossas vidas.

Depois de todos estes reencontros, foi altura de irmos procurar a cruz de metal com que trabalhamos no campo e que o ano passado deixámos guardada no laboratório. Como era de esperar lá estava ela! Vamos então tratar do que nos faz ainda falta… uma conta de e-mail para nos podermos contactar com o mundo. Criar a conta é fácil, o problema é que há uma semana que ninguém consegue receber correios, parece que é possível enviar, mas os tipos do satélite estão a mudar os IP de utilização e por isso é impossível receber. Esperam que em 3 dias este assunto esteja solucionado e aí poderemos voltar a comunicar-nos normalmente com o exterior.

Precisávamos contactar o Gonçalo na base Juan Carlos I em Livingston, mas ao que parece, as notícias dizem que eles ainda estão pior que nós, não conseguem enviar nem receber e-mail, para além de que aqui na base espanhola todavia não sabem sequer se eles têm o telefone a funcionar, devido à ligação de satélite que utilizam. Realmente há 4 dias atrás enviei um e-mail ao Chris (electrónico de Juan Carlos I) para saber o e-mail do Gonçalo da base e para bromear um pouco com ele e esse correio veio devolvido, o que me pareceu muito estranho porque esse sempre foi o seu e-mail. Ao que parece já nessa altura estavam sem contactos.

A adicionar a esta questão dos correios temos ainda outro problema. As nossas caixas de trabalho ainda não chegaram e por isso o único material que temos para trabalhar é a cruz. No dia 1 de Janeiro (um dia antes da nossa saída de Lisboa) fomos informados pelo Programa Antárctico Espanhol que as nossas caixas estavam atrasadas. Ao que parece o cargueiro onde seguia o contentor com o material antárctico, de várias equipas, que saiu de Espanha a caminho de Ushuaia, teve um qualquer problema, que até agora não compreendemos, e por isso teve de parar uns dias em Montevideu (Uruguai). Essa paragem fez que, ao contrário do que estava previsto, a carga antárctica espanhola não estivesse em Ushuaia na data em que o Las Palmas sairia do porto para ir distribuir esse material às bases Juan Carlos I e Gabriel de Castilla. Assim, e apesar de o Las Palmas ter atrasado a sua partida um dia, devido a condições meteorológicas não pode esperar mais e zarpou em direcção à Antárctida. Desta forma, todas as nossas caixas de trabalho devem estar agora em Ushuaia, e segundo consegui perceber, existem pelo menos outras 2 equipas que estão só com metade do material. O que sabíamos quando saímos de Lisboa é que iam tentar enviar o material a Juan Carlos I (Livingston), onde está o Gonçalo, pelo barco que está a levar material para a reconstrução da base. Até agora não sabemos se tal foi possível, pois as comunicações de satélite não estão fáceis. O que sabemos é que aqui em Deception não chegou nada e o Las Palmas só voltará entre dia 18 e 20 pelo que antes dessa data vamos aproveitar para construir os locais de monitorização com a cruz e começar com a mesma, bem como fazer perfis de campo de reconhecimento do permafrost.

Depois de um excelente almoço na nossa base é altura de ir para o campo. Hoje fizemos o reconhecimento de Cerro de La Cruce e de Punto 2, onde a Raquel o ano passado mantinha a monitorização da camada activa. Desta forma, aproveitámos também para procurar 5 locais com as condições que necessitamos para colocar os locais de monitorização. Apesar da chuva e do vento e de chegarmos todos molhados à base passou-se muito bem a tarde.

Hoje o jantar foi de recepção. A comida aqui na base é sempre muito boa, mas hoje o Javier (Cozinheiro) fez um jantar de luxo. Comemos uns crepes de espinafres de entrada, um peito de frango recheado com molho de cogumelos e de sobremesa salada de fruta com gelado. Para terminar o enfermeiro da base “El Brujo” presenteou-nos com uma apresentação de música onde ele tocava e cantava que foi muito divertida.


1 comentário:

  1. Já és "argentina", moça:
    "...ele havia estado por aqui no final da campanha..."
    "... bromear com ele..."
    "... inolvidável..."

    É o que dá o convívio diário com malta a falar castelhano...

    Bem, eu cá continuo a não me "olvidar" de postar o teu belíssimo diário de campanha, que me tens enviado por mail! Tudo tranquilito, e continua aí em força! :)

    Beijinhos,
    Bruno

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